segunda-feira, novembro 01, 2010

breve homenagem a um cachorro morto

falar mal de política hoje em dia é como chutar cachorro morto. Dizer que o país tá perdido, que o sistema não tem jeito e que tinha que explodir uma bomba em Brasília parece ser praticamente um senso comum, e é o jeito mais fácil de conseguir a empatia do taxista ou do cara na fila do banco. As estatísticas não mentem...
- Tiririca, “pior que tá não fica”: 1,3 milhões de votos.
- Abstenções no 2º turno: 29,19 milhões.
- Votos nulos: 4,69 milhões (e a apuração não terminou).
- Capitão Nascimento socando o secretário de segurança pública: 6 milhões de espectadores (e nem perto de parar por aí).
nessas horas, ver o país eleger um presidente sem sobressalto, contando os votos em um punhado de horas, com todo mundo assistindo o discurso de posse na TV como se fosse banal não tem preço.
e confesso que ao contrário de quase todo mundo ao meu redor, eu já andava torcendo pra Dilma e pro Serra cada vez que eles apareciam no debate. Mesmo não acreditando de verdade no que nenhum dos dois dizia. Simplesmente porque, em tempos de catarse coletiva em dizer que tá tudo uma merda e não tem como piorar (frequentemente vindo de gente que não tá nem minimamente próximo da merda), ver neguinho indo votar com adesivo no peito, por convicção, sem fanatismo nem ingenuidade, me inspira um certo respeito. Ver gente fazendo campanha ao invés de falando mal do mundo no twitter começou a me inspirar um certo respeito. E ver gente em cima de palanque dando a cara pra bater, ao invés de ser mais um cara sentado na mesa do bar se queixando de que a sociedade tá toda podre, como se a cerveja e o bolinho de bacalhau se materializassem ali por mérito exclusivo dele, no fundo também me inspira respeito. Mesmo que uma parte bastante grande dele não seja nem um pouco merecido.
e até eu, que normalmente não acredito em porra nenhuma, nesses dias tranquilos em que se assiste o discurso de posse na internet enquanto se pede uma pizza no telefone tenho a impressão extremamente pragmática de que alguma coisa não vai tão mal. Chutem os cachorros à vontade, mas aqui não é a Bolívia, nem a Etiópia, nem o Afeganistão. Também não é nenhuma Brastemp. Mas sei lá, se baixar a cabeça e botar pra funcionar, alguma coisa anda. E algum mérito nisso o tal do sistema deve ter. Por mais errado que esteja. E ao olhar o rosto igualmente pragmático e sem carisma que encarna pela primeira vez o posto de representante de tudo isso na TV, a minha maior esperança é que ele também intua isso. A julgar pelos primeiros vinte minutos, pelo menos, ainda dá pra esperar que sim, quem sabe.
enfim, boa sorte.

3 comentários:

Bípede Falante disse...

Olavo, eu estou super farta de caras e dentes.

O Arco da Madrugada disse...

também a mim o momento inspirou um certo respeito..

engraçado, mas pós esse"rosto pragmático e sem carisma" como vc diz, me veio um certo alento e pensando bem

me ocorreu a mesma coisa:

ALGUM MÉRITO nisso o tal sistema deve ter...e não é??

karine disse...

Um comentário muito atrasado, pelo mérito da "obra literária".
Pô Olavo, tu escreve muito bem! Adorei.
Beijos da tua fã!