quando me convidaram pela primeira vez prum debate na Bienal do Livro aqui do Rio, a ser realizado às duas da tarde de um feriado no meio da semana, minha primeira reação foi "putz, dá até vergonha de convidar gente pra uma roubada dessas". Tipo, quem diabos se deslocaria até o Riocentro no meio da tarde do feriado pra ver uma exposição de livros? Se a Feira do Livro de Porto Alegre já se torna frequentemente o inferno na terra, mesmo acontecendo num dos lugares mais aprazíveis da cidade, imagina um evento literário que acontece num centro de convenções na Barra da Tijuca (parte integrante do município de Miami, FL).
mas aí sei lá, fui comentando a ideia com as pessoas e fui ouvindo comentários como "puxa, que legal" (?), "caralho, vai estar cheio pra burro no feriado" (??) e, "puxa, eu tava mesmo pensando em ir" (???). E olhando a programação da Bienal, aparentemente o evento de fato tem lá o seu peso. Então sei lá, tô quase aceitando a ideia de que pode ser legal. E que talvez até mesmo venha a ser. Mesmo sendo na Barra. E mesmo sem que eu consiga entender nada disso.
sendo assim, tá feito o convite. A mesa rola no dia 07/09 (4a feira) às 14h, no estande da SEC-RJ (Pavilhão Azul, número 13), se chama "Contos e Outras Novelas" e, além de mim, conta com a participação de Alexandre Marinho e Delano Valentim, figuras com quem eu estou bastante curioso pra conversar melhor (pra quem quiser, aqui tá a programação do resto do evento da SEC). Até porque além de mim, certamente a Bienal deve ter outros atrativos suficientes pra ocupar uma tarde. Aos bravos aventureiros que lá chegarem, sua presença será mais do que bem vinda.
e se fizer sol, prometo fazer o melhor que der pra competir com a praia.
segunda-feira, setembro 05, 2011
sábado, agosto 27, 2011
o ódio que nos une

mesmo que minha danação eterna tenha sido revogada, no entanto, uma coisa segue me chamando a atenção. Tudo bem que o pastor não goste de ser associado com alguém que fala coisas como ”porra” e “caralho” e alerte os seus seguidores de que eu não sou ele - eu faria o mesmo se alguém me confundisse com um pastor. Mas será que não tinha como fazer isso sem fazer com que eu automaticamente me transformasse no diabo? Tipo assim, eu não poderia ter sido simplesmente definido de forma um pouco mais neutra: um outro qualquer, um ateu irrelevante, um desbocado crônico, ou algo do gênero?
enfim, aparentemente não. Ao que parece, o diferente do Senhor parece ser automaticamente classificado como vindo do demônio por essas paradas, num dualismo que infelizmente permeia boa parte das religiões organizadas do mundo. O que me faz pensar que talvez tenha alguma razão profunda pra esse tipo de coisa. É esquisito, mas parece que qualquer movimento de massa, seja uma religião, um partido político ou uma torcida de futebol, sempre tem que ter um inimigo. Os talibãs precisam dos americanos, os judeus precisam dos palestinos, os gremistas dos colorados, os croatas dos sérvios, os petistas do PSDB, os crentes do capeta. E sei lá, isso parece recorrente demais pra ser mera coincidência.
talvez porque se opor a algo em comum, no fundo, seja uma das formas mais básicas de identificação entre um grupo de pessoas. Afinal, é muito mais fácil encontrar diferenças em comum do que semelhanças verdadeiras entre as pessoas. Se eu penso A e você pensa B, podemos discordar em quase tudo – mas haveremos de convir que C está errado. Pra juntar As e Bs, portanto, nada melhor do que usar um grito de ordem como “C é um idiota” (ou, opcionalmente, "C está possuído pelo demônio"). E provavelmente por isso encontrar um vilão sempre foi a forma mais simples de unir as pessoas em torno de uma causa ou manipulá-las pra um fim – e não é a toa, afinal, que qualquer movimento revolucionário geralmente só consegue manter a coesão até que o inimigo a ser derrubado cai. Depois disso, começa o quebra-pau feio, e os jacobinos e girondinos e trotskistas e stalinistas e xiitas e sunitas se pegam no pau até a morte.
enfim, no fundo a verdade é que a assimetria fundamental entre a facilidade da diferença e a aridez da semelhança parece ter raízes profundamente entranhadas na estrutura do mundo – dentro da própria lógica, é muito mais fácil provar que duas coisas são diferentes (basta apontar uma única diferença) do que argumentar que ambas são iguais (já que uma única diferença falsificaria a afirmação), um fato que deve ser familiar pra quem trabalha com estatística ou metodologia científica em geral. E parando pra pensar, talvez essa assimetria explique bastante coisa sobre o mundo. E se você, como eu, é do tipo que solta foguetes quando o time adversário perde pro campeão congolês, vai haver de concordar que alguma razão existe pra isso.
moral da história: você quer manter seu rebanho unido? Encontre um inimigo comum. Aparentemente, tem funcionado pros pastores mundo afora. O que surpreende é que até mesmo um escritor pé-rapado como eu seja candidato a demônio. Mas enfim, todo mundo está sujeito a virar bode expiatório de vez em quando.
ou, alternativamente, talvez meu xará pastor tenha razão, e em breve eu comece a girar o pescoço e lançar jatos de vômito verde. O futuro dirá quem estava certo.
quinta-feira, agosto 11, 2011
possuído!

minha mais recente acusação de possessão demoníaca, cortesia do meu xará no Twitter, Pastor Olavo Amaral, depois que eu usei a palavra “caralho” em um tweet. Superestima um pouco os meus poderes, é verdade. E também durou pouco tempo, já que fui perdoado logo depois. Mas foi suficiente pra sentir um certo orgulho – nada mais fashion do que ser um escritor excomungado, afinal. Meu assessor de marketing precisa me conseguir mais oportunidades dessas.
terça-feira, julho 19, 2011
na tábua e no museu

sábado, junho 18, 2011
do artesanato
quarta-feira, junho 01, 2011
tomates secos, ou o nome das coisas

“Pedi que [o taxista] pegasse leve na velocidade”, conta [a menina]. Ainda de acordo com seu relato, ele não respeitou e disse: “Continua fazendo essa merda aí atrás, que eu continuo aqui na frente”. Ela diz que estava apenas conversando com a namorada. Ao ouvir a resposta, a musicista retrucou: “Você quer me matar e ainda é homofóbico?”. Ele teria respondido que sim.”
não, eu não queria manifestar a minha indignação com o evento. Só achei que devia atestar uma certa perplexidade linguística. Porque convenhamos, “você quer me matar e ainda é homofóbico” parece uma frase de uma novela muito ruim. Tipo, como querer matar alguém não fosse suficiente, ele ainda é homofóbico. Caralho, que espécie de roteirista anencéfalo escreve um troço desses?
mas enfim, já dizia tio Woody, a vida não imita a arte, ela imita maus programas de TV.
ou seja, pra confusão geral da bancada evangélica, parece que a palavra “homofobia” passa por um processo rápido de demonização, pra juntar-se a coisas como “pedofilia”, “bullying” e seus amigos. Todas elas partilhando a condição de (a) serem coisas obviamente abjetas e (b) por algum motivo, precisarem ter se transformado num rótulo vagamente demoníaco pra deixarem de ser ignoradas. Porque qualquer maior de idade pode constatar que tinha neguinho que apanhava todos os dias quando era adolescente no colégio (sendo a sala de aula talvez o ecossistema mais cruel existente na natureza). Mas que na nossa época aquilo parecia uma dificuldade da vida, e só quando algum psiquiatra gringo metido a besta deu um nome oficial pro troço isso pareceu virar um foco de atenção pro público.
o que talvez seja ótimo pra chamar a atenção pra causa, claro. Mas nos força a lidar com esses diálogos de filme ruim. E com esse certo desconforto de estar adicionando mais um item na interminável lista de rótulos do mundo. Afinal, como exatamente se define que “você é homofóbico”? Listinha de critérios no DSM-IV? Algum teste genético, quem sabe? Sei lá, o conceito de homofobia sempre me pareceu um tantinho complexo e arraigado demais pelos cantos escuros da personalidade pra transformar em rótulo. Como o de homossexualidade, aliás.
mas a bem da verdade, não é nenhuma novidade que as pessoas precisem de rótulos pra sobreviver, como já dizia tio Caetano (“para os americanos branco é branco, preto é preto e a mulata não é a tal/Bicha é bicha, macho é macho, mulher é mulher e dinheiro é dinheiro/ E assim ganham-se, barganham-se, perdem-se, concedem-se, conquistam-se direitos”). Pra não falar da ala dos doentes, vide “transtorno bipolar”, “déficit de atenção” e “intolerância a lactose” (alguém lembra desses nomes há uns vinte anos atrás?). E mesmo a rotulação demonizadora do inimigo sempre foi lugar comum em um sem número de contextos (“os comunistas”, “os neoliberais”, “os libertinos”, “os ateus”). Ainda assim, é engraçado ver ela surgir também dos setores teoricamente avançados da sociedade, que costumavam reclamar dos rótulos em primeiro lugar. Mas sei lá, acho que é pra bem. Se o mundo ficar mais simplista e tosco, mas for um lugar mais tranquilo pras namoradas se darem as mãos, provavelmente tá valendo.
mas enfim, isso tudo era só pra dar boas vindas ao rótulo de “homofóbico”. Pra que ele se sinta acolhido na sociedade e se junte a “culpado de bullying”, “portador de transtorno bipolar” e “intolerante a lactose” na ala dos tomates secos verbais: coisas das quais ninguém tinha ouvido falar há meia dúzia de anos atrás, mas que subitamente entraram na moda e agora são quase impossíveis de tirar do meio da sua comida. Mesmo que você tenha pedido sushi.
E depois dizem que escritores são uma classe desvalorizada. Puta bobagem. Pra inventar qualquer coisa, basta encontrar um bom nome. As máquinas de zeros e uns que me perdoem, mas a língua ainda constrói o mundo.
domingo, maio 22, 2011
para a Espel

não existe silêncio quando se está sozinho. O ruído interno sem ninguém pra interromper é um arranha-céus em obras dentro da minha cabeça. E isso por si só, somado com a inquietação da falta de alguém, impede qualquer possibilidade de paz.
estar acompanhado, por outro lado, tampouco traz silêncio. Estar junto com alguém é uma experiência intensa e uma demanda constante. E precisar falar, responder, estar atento e corresponder ao que o outro procura é um diálogo interminável do qual não se descansa.
então talvez a única situação onde eu consiga ficar em paz seja com muita gente em volta. Minha mãe nunca entendeu porque eu tinha que levar quinze pessoas pra praia ao invés de cinco. Ou porque qualquer festa lá em casa com menos de cinquenta pessoas parecia um fracasso. E eu mesmo por um tempo acreditei que de fato fosse vaidade, alguma ânsia boba de popularidade a ser superada.
mas nesse fim de tarde pós-festa, em que o dia acaba lento do outro lado da enseada, eu considero a possibilidade de que a razão seja outra. De que ter gente o suficiente em volta talvez seja a única maneira de desligar o fluxo e não pensar em nada. Porque depois dos convites feitos, da cerveja no gelo, da porta aberta, eu posso suavemente ficar no meu canto e me tornar dispensável. Sem ter que prestar contas a ninguém. E sem ter que aturar a mim mesmo. Porque a companhia ao meu redor é grande e querida. E porque ela deixa de precisar de mim. E sobramos então eu e o mundo, terno e indiferente, sem nenhum pensamento ou compromisso se interpondo entre nós.
meu único silêncio é a multidão.
segunda-feira, maio 02, 2011
sábado, abril 30, 2011
autodivulgação gratuita (e abrupta) (mcxviii)

e afora isso, os eventos rolam até o final da semana que vem, com muita coisa legal e amigos queridos do mundo literário de Porto Alegre (e alhures) falando, discutindo, debatendo, declamando e tomando cerveja (veja a programação aqui) - e com o livro à venda na maior parte deles, suponho. Não estarei por aí pra aproveitar desta vez, mas compareçam por mim.
quinta-feira, abril 07, 2011
teoria musical
segunda-feira, março 14, 2011
você, um artista
se
você fizer um filme e ninguém assistir, isso não faz de você um artista.
do mesmo modo, se você fizer um filme e conseguir que ele passe num festival de cinema alternativo, numa sessão no meio da tarde de um dia de semana em que não mais que uma meia dúzia de pessoas vão chegar a assistir, isso também não chega a fazer de você um artista.
por outro lado, se você alardear pra não sei quantas centenas de pessoas via facebook, twitter, blogs e congêneres que seu filme está passando no CCBB, mesmo que nenhuma delas vá assistir, pelo menos uma parte razoável delas vai saber que você está fazendo cinema. Provavelmente uns tantos farão perguntas. Talvez alguns até comecem a apresentá-lo como cineasta. E paradoxalmente, num mundo em que todos os outros critérios caíram por terra, é justamente isso que acaba fazendo de você um artista. Pelo menos aos olhos dos outros.
vai entender.
feito o preâmbulo, era só pra dizer que “Um Filme Brasileiro”, minha pequena pílula cinematográfico-conceitual agora elevada à categoria de clássico, tá passando em uma das sessões retrospectivas da 10ª Mostra do Filme Livre, evento massa que tá rolando nos CCBBs do Rio e de São Paulo nas próximas semanas. O filme passa nos dias 25/03 (RJ) e 27/03 (SP) às 16h, mas tem bastante outras coisas legais na mostra (inclusive o Ainda Orangotangos, no qual também fiz uma pontinha). Vale a pena conferir o programa.
e pra quem não puder ir, o filme também tá no youtube, by the way – é só seguir o link no canto superior direito desse blog. Mas isso já não tem a mesma graça. E nem vai fazer de mim um artista.
novamente, vai entender.

do mesmo modo, se você fizer um filme e conseguir que ele passe num festival de cinema alternativo, numa sessão no meio da tarde de um dia de semana em que não mais que uma meia dúzia de pessoas vão chegar a assistir, isso também não chega a fazer de você um artista.
por outro lado, se você alardear pra não sei quantas centenas de pessoas via facebook, twitter, blogs e congêneres que seu filme está passando no CCBB, mesmo que nenhuma delas vá assistir, pelo menos uma parte razoável delas vai saber que você está fazendo cinema. Provavelmente uns tantos farão perguntas. Talvez alguns até comecem a apresentá-lo como cineasta. E paradoxalmente, num mundo em que todos os outros critérios caíram por terra, é justamente isso que acaba fazendo de você um artista. Pelo menos aos olhos dos outros.
vai entender.
feito o preâmbulo, era só pra dizer que “Um Filme Brasileiro”, minha pequena pílula cinematográfico-conceitual agora elevada à categoria de clássico, tá passando em uma das sessões retrospectivas da 10ª Mostra do Filme Livre, evento massa que tá rolando nos CCBBs do Rio e de São Paulo nas próximas semanas. O filme passa nos dias 25/03 (RJ) e 27/03 (SP) às 16h, mas tem bastante outras coisas legais na mostra (inclusive o Ainda Orangotangos, no qual também fiz uma pontinha). Vale a pena conferir o programa.
e pra quem não puder ir, o filme também tá no youtube, by the way – é só seguir o link no canto superior direito desse blog. Mas isso já não tem a mesma graça. E nem vai fazer de mim um artista.
novamente, vai entender.
segunda-feira, março 07, 2011
segunda-feira, fevereiro 28, 2011
versinho zen-budista feito em casa (lxiii)
segunda-feira, janeiro 31, 2011
sobre por que fazer antes o que alguém já vai fazer por você

o que você faz?
(a) diz “que ótimo, meu bem, você leu os meus pensamentos. Vou aproveitar que você já fez o café pra ir botando os talheres na mesa e dando uma limpada na cozinha, OK?”
(b) suspira algo como “caralho, eu te amo” e enche ela de beijos no pescoço, aproveitando que ela está ocupada com os pratos pra dar uma esfregada básica naquele corpo indefeso inclinado sobre a pia da cozinha.
(c) pensa “senhor, eu não mereço tanto” e volta sorrateiramente para o quarto, deitando novamente pra esperar que ela lhe traga o café na cama enquanto você finge dormir e não saber de nada do que está acontecendo.
(d) precipita-se pra dentro da cozinha, abrindo à geladeira às pressas, apanhando a comida e disputando espaço na pia pra fazer o mesmo café da manhã que ela já está fazendo, simplesmente pra terminar antes dela e ter o mérito de colocá-lo na mesa antes. E fica frustrado por semanas ou meses a fio se ela por acaso conseguir servi-lo primeiro.
sinceramente, não importa muito se você simpatiza com a alternativa “a”, “b” ou “c”. O que importa é que é imensamente provável que você (assim como qualquer pessoa minimamente normal) tenha imediatamente relacionado a alternativa “d” a algum grau de psicose em estágio avançado. Certo?
ok.
agora transfira a cena pra um laboratório de pesquisa, em que você tem uma ideia que lhe parece boa, está começando a trabalhar nela, e aí subitamente fica sabendo que alguém em algum lugar do mundo está trabalhando exatamente na mesma coisa que você estava pensando em fazer, e tentando encontrar os mesmos resultados que você esperava encontrar para publicá-los.
o que você faz?
não vou enumerar as alternativas. Mas da próxima vez que você disser que faz ciência (ou seja o que for que você faz) pra fazer uma contribuição para a humanidade, e não pelos seus próprios interesses, pelo menos pense nisso.
sábado, janeiro 22, 2011
certezas ruindo

- Boa noite.
- Boa noite. Uma para "Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas." (morrendo de medo do que o caixa vai pensar de quem paga pra assistir um filme com um título esdrúxulo desses)
- Às nove e cinquenta?
- (com ar de incompreensão) Não, às sete e quarenta.
- Está lotado.
- Lotado? (incrédulo) LOTADO? Nunca ninguém disse para você que FILMES TAILANDESES NÃO PODEM LOTAR UMA SALA DE CINEMA! (furioso) Que isso vai CONTRA AS LEIS MAIS FUNDAMENTAIS DO UNIVERSO? (agarrando o caixa pelo pescoço) Você não leu ESTE POST?
(obs: última fala discretamente modificada por motivos de licença poética)
não há dúvida, todas as minhas certezas andam ruindo. Estranho lugar, esse rio de janeiro.
domingo, janeiro 16, 2011
a vida é uma sala vazia

e nesse momento peculiar, talvez o mais solto e desvinculado em uma década, eu olho pra trás e tenho a impressão de que, conscientemente ou não, eu tenho lidado com a minha vida do mesmo jeito que com a minha sala. Fugindo do jeito que posso de construir algo de que eu não vá conseguir me livrar. E mantendo o espaço aberto pra uma festa que talvez seja tão teórica e improvável quanto uma invasão dos tártaros. E cada vez mais eu me sinto capaz de enxergar isso não com remorso ou arrependimento, mas apenas com a consciência de que é inevitável. Porque mesmo que na terceira pessoa a gente seja definido pelo que constrói, a experiência da vida em primeira pessoa sempre vai ser a do espaço que se tem. E mesmo que preenchê-lo ande meio difícil nesses dias, a experiência e a inquietação do espaço aberto por si só já compõem um sentido. E têm sido a minha melhor maneira de me definir, de arranjar direção pro tempo, de encontrar um fio condutor pra narrativa dos meus dias. No fim das contas, mesmo com o apartamento menor, o espaço na sala segue sendo o único reflexo fiel do lado de dentro. O resto é só um punhado de móveis.
sábado, dezembro 18, 2010
porto alegre, fim de uma década

domingo, novembro 28, 2010
a vida nos tempos da guerra (versão zona sul)

pois é, hoje foi assim.
essas cidades são todas umas putas.
particularmente por darem o seu amor a tão poucos.
segunda-feira, novembro 22, 2010
pessoanices gratuitas (i)
o dia em que decidiram que a coerência era uma virtude e a preguiça era um pecado foi o dia em que a humanidade rompeu relações comigo.
quinta-feira, novembro 11, 2010
coisas pra se pensar em instantes de asfixia (lviii)
nunca levei fé nessa história de tantos por cento de inspiração e tantos por cento de transpiração. Pra mim, escrever foi sempre cem por cento de respiração. Simples assim.
segunda-feira, novembro 01, 2010
da série "o que seria da minha confiança básica no mundo se não fosse hollywood?" (ii/iii)

breve homenagem a um cachorro morto

- Tiririca, “pior que tá não fica”: 1,3 milhões de votos.
- Abstenções no 2º turno: 29,19 milhões.
- Votos nulos: 4,69 milhões (e a apuração não terminou).
- Capitão Nascimento socando o secretário de segurança pública: 6 milhões de espectadores (e nem perto de parar por aí).
nessas horas, ver o país eleger um presidente sem sobressalto, contando os votos em um punhado de horas, com todo mundo assistindo o discurso de posse na TV como se fosse banal não tem preço.
e confesso que ao contrário de quase todo mundo ao meu redor, eu já andava torcendo pra Dilma e pro Serra cada vez que eles apareciam no debate. Mesmo não acreditando de verdade no que nenhum dos dois dizia. Simplesmente porque, em tempos de catarse coletiva em dizer que tá tudo uma merda e não tem como piorar (frequentemente vindo de gente que não tá nem minimamente próximo da merda), ver neguinho indo votar com adesivo no peito, por convicção, sem fanatismo nem ingenuidade, me inspira um certo respeito. Ver gente fazendo campanha ao invés de falando mal do mundo no twitter começou a me inspirar um certo respeito. E ver gente em cima de palanque dando a cara pra bater, ao invés de ser mais um cara sentado na mesa do bar se queixando de que a sociedade tá toda podre, como se a cerveja e o bolinho de bacalhau se materializassem ali por mérito exclusivo dele, no fundo também me inspira respeito. Mesmo que uma parte bastante grande dele não seja nem um pouco merecido.
e até eu, que normalmente não acredito em porra nenhuma, nesses dias tranquilos em que se assiste o discurso de posse na internet enquanto se pede uma pizza no telefone tenho a impressão extremamente pragmática de que alguma coisa não vai tão mal. Chutem os cachorros à vontade, mas aqui não é a Bolívia, nem a Etiópia, nem o Afeganistão. Também não é nenhuma Brastemp. Mas sei lá, se baixar a cabeça e botar pra funcionar, alguma coisa anda. E algum mérito nisso o tal do sistema deve ter. Por mais errado que esteja. E ao olhar o rosto igualmente pragmático e sem carisma que encarna pela primeira vez o posto de representante de tudo isso na TV, a minha maior esperança é que ele também intua isso. A julgar pelos primeiros vinte minutos, pelo menos, ainda dá pra esperar que sim, quem sabe.
enfim, boa sorte.
quinta-feira, outubro 21, 2010
sexta-feira, outubro 01, 2010
breviário da implosão

mas o que importa na história não é a implosão (novamente, simples e previsível). O que fascina é a lenta, gradual e inexorável separação da parte funcionante do hospital da parte condenada. Que há semanas vem sendo executada a martelada, andar por andar, num ritmo agonizantemente lento por homenzinhos de laranja. E que pelas minhas contas ainda deve demorar uns dois meses de trabalho. Ou algo assim. Porque implodir um troço morto é a coisa mais fácil do mundo. Mas separar a parte morta da viva, pra que a parte viva não desabe junto com a outra, é uma sequência repetitiva e interminável de marteladas no concreto. Uma a uma. Do décimo quarto andar até o rés-do-chão.
não sei se sou eu que ando propenso a enxergar metáforas. Mas sei lá, ainda não me acostumei a chegar no trabalho e olhar praquele buraco. Ao contrário de todo o povo que passa, eu não ando imune aos abalos. Pain is in the eye of the beholder.
terça-feira, setembro 21, 2010
das vantagens de se andar com lágrimas nos olhos de vez em quando (i)
sexta-feira, setembro 17, 2010
a propósito do post imediatamente abaixo (ii)
a ilustração, por essas coincidências da vida, é do manuscrito de 1984, do Orwell, clássico-mor sobre como reescrever a história. O ministério da verdade não me deixa mentir.
quarta-feira, setembro 15, 2010
nossas últimas versões

então vocês começarão com versões tão diferentes da história que rirão à beça quando ganharem coragem pra trocá-las pela primeira vez. E descobrirem que apesar de terem estado nas mesmas cenas, ou mesmo juntos no centro do palco, vocês até então tinham feito parte de peças distintas, casualmente encenadas no mesmo teatro. Que tinham sido coadjuvantes involuntários de um texto que nem sequer tinham lido. E depois de rirem e beberem mais vinho e fecharem a janela pros vizinhos não verem o que vocês farão depois, vocês acordarão no outro dia dispostos a não deixarem mais suas versões divergirem. E passarão a se telefonar todos os finais de tarde dispostos a contarem e ouvirem como foram seus dias, e ao se encontrarem num bar qualquer revisarão suas versões, trocarão críticas, se frustrarão com as discrepâncias. Mas estarão sempre prontos pra puxar o lápis e rabiscar anotações, correções, maneiras de deixar as histórias mais compatíveis. E em algum momento, pra garantir que o espetáculo não saia do rumo, vocês talvez cheguem a unificar o cenário, contratem um cenógrafo ou um arquiteto e debatam longamente na loja de móveis pra ter certeza de que aquele abajur realmente combina com o enredo, que a essa altura vocês já têm a certeza de que é de fato o mesmo. E de tão certos de transitarem na mesma peça, tão convencidos de terem se tornado os personagens que representam, talvez vocês comecem então a deixar os ensaios de lado, seguros que serão capazes de improvisar, de se adaptar aos deslizes e aos esquecimentos um do outro, às falas empacadas na ponta da língua. Até o dia em que uma entrada ou saída de cena inesperada de um se atravesse na frente da história do outro, interrompendo bruscamente o fluxo da narrativa e fazendo vocês pararem a encenação pra revisar as anotações, descobrir exatamente quem errou a deixa. E cometerem o erro de tirar os scripts do bolso, apenas pra se darem conta de que os textos que vocês interpretam não são mais os mesmos. Sim, haverá pontos em comum, um mesmo cenário e uma mesma época. Mas as discrepâncias entre os acontecimentos serão óbvias, uma conversa romântica numa praia deserta transformada em um momento entediado numa estação de trem, os protagonistas de uma das histórias reduzidos a coadjuvantes da outra. E sem saber o que fazer com personagens tão distintos num cenário em comum vocês retrocederão para trás das cortinas sob aplausos tímidos, e sairão do teatro cada qual para o seu lado. Em camarins separados, trabalharão febrilmente em reescrever suas histórias, já não pra fazer delas a mesma, mas simplesmente pra fazer sentido, encontrar um fio narrativo pras falas desconexas e personagens desencontrados. E apelando pra suas soluções dramáticas preferidas, sem se preocupar demais com os fatos, vocês se converterão uma vez mais em ficcionistas onipotentes. Começando a gostar das suas novas versões, vocês as relerão antes de dormir e as carregarão no dia seguinte, tirando-as do bolso pra folhear no metrô e mostrar pros amigos. E começarão a interpretar seus novos personagens ao natural, antes mesmo de terem muita idéia da continuação do enredo. Até o dia em que vocês se encontrarão em alguma esquina movimentada, e sem que nenhum dos dois tenha nada de urgente pra fazer entrarão num café pra falarem do que andam fazendo. Então tirarão os textos do bolso, lembra aquela história que a gente tinha tentado escrever?, e mostrarão um ao outro suas últimas versões. E lendo aquilo, incrédulos, saberão que já não há nada mais de uma história em outra, que as falas estão todas trocadas, que os personagens que um dia foram seus já são outros nos quais vocês sequer se reconhecem mais. Sem querer aceitar, vocês ainda tentarão trocar reclamações banais, acusações baratas, cobranças de protagonismo. Mas a revolta será inútil, pois tão logo vocês virarem as costas mesmo essas reclamações já terão sido reescritas. Então o café termina, e sem saber o que fazer vocês se despedem rápidos e desajeitados. E caminham pra casa, abismados com a constatação de que a história que vocês carregam no bolso é o último exemplar de sua espécie. De que já não há coautores, atores ou espectadores. E de que ela sobreviverá apenas até o momento em que por cansaço ou alzheimer vocês resolvam esquecê-la. Já em casa vocês pegarão o texto, brincarão com as páginas olhando distraídos pra sacada, pra lata de lixo, pra lareira acesa. E saberão que o desaparecimento daquela versão depende apenas da vontade de começar um texto novo. A caixa de fósforos está sobre a mesa. Dou-lhe uma, dou-lhe duas.
domingo, setembro 05, 2010
breviário
domingo, agosto 22, 2010
terça-feira, agosto 17, 2010
quem ama castra

segunda-feira, agosto 16, 2010
dois dias de inverno e uma morte gentil
o primeiro dia de inverno em um ano de rio de janeiro combina comigo. Combina com o meu jeito quieto, com os meus cabelos grisalhos, com a imobilidade do apartamento vazio. E me ajuda a conviver com uma morte lenta, quase que gentil, oferecida a mim entre sorrisos e bichos de pelúcia. E eu me dou conta que devagar vou entrando em acordo com ela, não por concordância senão por impotência em fazer algo que não seja acompanhar o fluxo do mundo. E como que em retribuição o mundo é gentil o suficiente pra acompanhar o meu luto, acinzentando o céu e derrubando os termômetros. E fazendo com que a dor vá devagar deixando de ser o peso reprimido no caminhar rápido sobre a barata ribeiro, na lágrima que escapa no banco do 485 preso no trânsito da linha vermelha. E passe a ser uma melancolia que extravasa a mim mesmo e escorre das minhas caixas de mudança abertas. Um frio discreto que invade a baía da guanabara, semeando araucárias na floresta da tijuca, pintando o calçadão da urca com flores de ipê, botando a faixa e o laço nas mãos daquele tio que fica em cima do morro. E enquanto a rua se esvazia e o mundo encolhe, começo a sentir novamente que ele possa fazer sentido, e me sinto esquisitamente feliz. Porque sinto que o frio de fora começa a substituir o de dentro, que novamente o que eu carrego em mim é o que pode me esquentar. Que se eu pegar um cobertor e um capuz eu possa quem sabe me proteger, já que o desconforto volta a viver do outro lado da epiderme. E assim abraçar dentro do casaco o que ainda me resta, manter apertado entre os braços, e com meu pequeno punhado de pedaços deitar na rede da sacada, olhar pra fora, ver o mundo. E reaprender a ficar imóvel, sabendo que agora é a vez dele se movimentar no meu lugar.
sábado, agosto 14, 2010
terça-feira, julho 20, 2010
filosofia zen feita em casa (xviii) - sobre a inevitabilidade da incoerência
domingo, julho 11, 2010
do lento aprendizado das tortinhas de palmito congeladas

uma só é pequena pra dois
mas abrindo duas vai sempre sobrar
pra guardar pra alguém que chegue
ou convidar um a mais pra jantar
mas embora pareça certo
a partilha nunca é precisa
as facas são cegas, as divisões toscas
e alguém sempre acaba com fome
então quem sabe melhor
comer três quartos sozinho
guardar o resto no congelador
e esperar que acumule, caso não
chegue ninguém inesperado
nenhuma fome imprevista
e sem saber do futuro
ir juntando os pedaços
aos poucos
sábado, julho 10, 2010
sobre a sanidade escoando pelo ralo
quinta-feira, julho 01, 2010
quanto mais as coisas mudam, mais elas permanecem as mesmas (mcxviii)

by the way, a resposta é "sim, vai mesmo." Mas e daí?
quarta-feira, junho 23, 2010
das verdades mais imbecis que já se conseguiu botar na boca de um público com doutorado completo

domingo, junho 20, 2010
quase solstício de inverno
domingo, maio 30, 2010
novas roupas coloridas

terça-feira, maio 25, 2010
i'm not there

quinta-feira, maio 13, 2010
regras pra justificar uma exceção
sempre desconfiei do conceito de “music video”. Tanto no que diz respeito a videoclipes (ai que palavra mais século passado...) como a DVDs de shows ou a imagens randômicas pra acompanhar música nas mais variadas mídias. Pura e simplesmente, nada contra a idéia em si. Mas nunca me pareceu algo que olhar alguém tocando um instrumento numa tela adicionasse suficientemente à música pra que justificasse o marketing em volta.
e no fundo, no fundo, esse troço de botar imagens em música sempre me pareceu simplesmente empacotá-la pra tornar algo vendável. Primeiro passando videoclipes na TV, que naturalmente é um veículo de publicidade muito melhor do que o pobre rádio. Depois com o ridículo advento dos “DVDs de shows” (e DVDs em geral) que alguém empurrou goela do público abaixo como algo a ser comprado (alguém lembra de alguma vez ter comprado uma fita de videocassete? Pois como diabos convenceram a geral que a mesma coisa numa mídia diferente era algo pra comprar?). E sem vender nada, mas ainda por força do mercado, hoje em dia se abate sobre o mundo uma terceira onda de vídeo forçosamente acoplado à música. Meramente porque por razões obscuras, compartilhar vídeo em streaming tornou-se fácil e universal enquanto fazer isso com áudio nunca chegou a ficar tão simples assim. Fazendo com que hoje em dia o jeito padrão de mostrar uma música pra alguém online seja mandar um link do Youtube. O que seria ótimo, não fosse o fato de que 95% dos vídeos feitos por pessoas bem intencionadas que devidem compartilhar suas músicas são sequências toscas de imagens piegas que eu jamais teria coragem de enviar pra ninguém.
enfim, só pra dizer que o excesso de imagens que não acrescentam nada às vezes cansa. Mas só pra dizer também que sempre tem uma exceção. Essa em particular transtornou meu dia por várias horas no início da semana depois que algum obcecado jogou no meu twitter. E o pior de tudo é que fica bem melhor em alta definição. Chamem-me de vendido. Mas sei lá, devem ser as mãos.
e no fundo, no fundo, esse troço de botar imagens em música sempre me pareceu simplesmente empacotá-la pra tornar algo vendável. Primeiro passando videoclipes na TV, que naturalmente é um veículo de publicidade muito melhor do que o pobre rádio. Depois com o ridículo advento dos “DVDs de shows” (e DVDs em geral) que alguém empurrou goela do público abaixo como algo a ser comprado (alguém lembra de alguma vez ter comprado uma fita de videocassete? Pois como diabos convenceram a geral que a mesma coisa numa mídia diferente era algo pra comprar?). E sem vender nada, mas ainda por força do mercado, hoje em dia se abate sobre o mundo uma terceira onda de vídeo forçosamente acoplado à música. Meramente porque por razões obscuras, compartilhar vídeo em streaming tornou-se fácil e universal enquanto fazer isso com áudio nunca chegou a ficar tão simples assim. Fazendo com que hoje em dia o jeito padrão de mostrar uma música pra alguém online seja mandar um link do Youtube. O que seria ótimo, não fosse o fato de que 95% dos vídeos feitos por pessoas bem intencionadas que devidem compartilhar suas músicas são sequências toscas de imagens piegas que eu jamais teria coragem de enviar pra ninguém.
enfim, só pra dizer que o excesso de imagens que não acrescentam nada às vezes cansa. Mas só pra dizer também que sempre tem uma exceção. Essa em particular transtornou meu dia por várias horas no início da semana depois que algum obcecado jogou no meu twitter. E o pior de tudo é que fica bem melhor em alta definição. Chamem-me de vendido. Mas sei lá, devem ser as mãos.
segunda-feira, maio 03, 2010
domingo, abril 18, 2010
me autodivulgando a mim mesmo de novo

- dia 21 de abril (quarta) às 20h, estarei no lançamento da coletânea O Melhor da Festa - volume 2, com textos do pessoal que participou da edição 2009 do evento. Sim, tem um troço meu lá no meio, como seria de se esperar. E a companhia em volta é deveras honrosa. Vai ser no Boteco do Pé (João Alfredo, 571), e além dos autógrafos deve rolar alguma espécie de agito cultural depois.
- dia 25 de abril (domingo) às 14h, estou num debate com Flávio Wild e Cássio Pantaleoni sobre "Conto, imagem e construção do invisível". Rola na Palavraria (Vasco da Gama, 165), ali pertinho de casa.
o resto da programação do evento tá no site, pros interessados. Apareçam. É tudo de graça, (ok, minto, o livro deve custar alguma coisa). E eu tenho várias saudades pra matar.
sexta-feira, abril 16, 2010
quinta-feira, abril 08, 2010
ressaca do apocalipse

sábado, março 27, 2010
segunda-feira, março 22, 2010
porque afinal não há nada de errado em foder com o pau dos amigos de vez em quando

incidentalmente, os caras acabam de lançar um disco chamado “Quase Certeza Absoluta”. Aparentemente tá nas melhores lojas de discos, pelo menos em Porto Alegre (pra quem tem menos de vinte anos, “loja de discos” é um lugar em que a gente costumava ir de vez em quando há muito tempo atrás). Pros que moram longe, dá pra comprar aqui. Ou então esperar que não demore pra cair no soulseek. Ave.
sábado, março 20, 2010
atrator estranho

hoje em dia eu continuo nunca tendo escrito um romance. Mas essa promessa parece cada vez mais furada. Primeiro porque eu já não sou tão jovem pra usá-la. Segundo porque já duvido de que um romance dependa de idéias estáveis sobre qualquer coisa, até porque elas não existem – minha impressão é que tudo o que dá pra fazer é se imbuir da verdade de um poema, de uma máscara sincera que se possa vestir de vez em quando. E terceiro porque a idéia de que a vida viria a ficar mais estável tem se revelado a mais estúpida de todas elas. Pelo menos até agora.
porque se é verdade que as descobertas e idéias e estados de espírito realmente novos vão rareando, por outro lado a idade vem me fazendo acumular um número de máscaras grande o suficiente pra me pulverizar por completo. E nesses tempos de dispersão geográfica e emocional, cada vez mais a vida parece ciclar incrivelmente rápido por atratores estranhos e desconexos. Todos eles urgentes e palpáveis, todos eles eu. Todos máscaras sinceras e vitais pra se conseguir dizer qualquer coisa. E no tempo presente eu sou capaz de me reconhecer em todos, e tudo parece muito natural. Com a exceção dos vinte segundos de estranhamento ao acordar em uma cama cujo atrator não tem nada a ver com o do sonho.
e pensando por esse lado deveria ser a fase mais eloquente da minha vida: afinal, se não existe poesia que não nasça do espanto, não há nada como o deslocamento do olhar pra poder espantar-se. Mas cada máscara e cada olhar novo tem me durado no rosto por tão pouco tempo que eu não consigo sequer sentar na frente do computador pra escrever qualquer coisa. Antes que qualquer palavra sedimente, alguém gira o caleidoscópio e a imagem já é outra.
é desses atratores estranhos da vida que vem a palavra, granted. Mas também é deles que vem o silêncio. Por ora, tenho andado com o segundo. Por respeito a ambos, e por pura incapacidade de fazer diferente.
segunda-feira, março 01, 2010
do manual de técnicas básicas de vendas para empresários da indústria fonográfica (xiv)

o plano é simples:
(a) convença a banda que você empresaria a fazer shows
(b) cobre bem caro pelo ingresso
(c) permita a entrada de câmeras digitais
(d) deixe a presa entrar, fotografar e filmar. E depois colocar as fotos e vídeos do show no seu orkut, facebook ou youtube, ao gosto do freguês.
pronto,você acaba de fazer com que um bem universal se transforme mais uma vez numa exclusividade para poucos. E, melhor ainda, uma exclusividade passível de exibição para os que não a possuem. O que, no fundo, sempre foi a essência dos melhores bens de consumo.
agora sente em sua poltrona e aproveite seu martini. Quem está ligando pra música, afinal?
quinta-feira, fevereiro 18, 2010
quinta-feira de cinzas
terça-feira, fevereiro 16, 2010
sábado, fevereiro 13, 2010
insônia branca, manhã de carnaval
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